A Bossa do Gordurinha



Acredito ser oportuno transcrever aqui no Blog o artigo do jornalista, crítico de televisão, rádio, jornal e internet; e DJ Brasileiro Marcelo Janot sobre o relançamento do disco "A Bossa do Gordurinha".

O filé-mignon do Gordurinha
by Marcelo Janot

Não é preciso pertencer a velhas gerações para conhecer a obra do genial compositor baiano Gordurinha embora seja raro achar, entre aqueles com menos de 30 anos, alguém que ao menos tenha ouvido falar nele. É que Gordurinha, mesmo tendo sido um intérprete carismático, ficou famoso mesmo na voz de Jackson do Pandeiro e Gilberto Gil, entre outros:

"Chiclete com banana": Só boto bebop no meu samba/quando o Tio Sam pegar no tamborim/quando ele entender que o samba não é rumba;

"Vendedor de caranguejo": Caranguejo-uçá, caranguejo-uçá/Apanho ele na lama/E boto no meu caçuá/Caranguejo bem gordo é gaiamum/Cada corda de 10 eu dou mais um;

São alguns exemplos de músicas manjadas de seu repertório.

Com o lançamento, dentro da coleção "Anos de Música" (BMG-Charles Gavin), de um de seus melhores discos "A Bossa do Gordurinha" talvez seja possível amenizar um pouco essa injustiça.

Waldeck Artur de Macedo, nascido em Salvador em 1922, entrou para a Rádio Sociedade da Bahia com 16 anos. Era magérrimo, o que lhe valeu a alcunha de Gordurinha, perfeita para quem já mostrava intimidade com o microfone cantando e fazendo humor.

Chegou a cursar medicina, mas largou os estudos para cair na estrada com sua companhia teatral. Embora posteriormente retornasse ao rádio e à música, a opção pelo humor foi prejudicial, na época, ao reconhecimento de seu talento como compositor; quando deveria ter sido justamente ao contrário, uma vez que Gordurinha foi um dos melhores cronistas musicais de seu tempo.

"A Bossa do Gordurinha", lançado em 1962 e penúltimo dos cinco LPs que gravou, é farto em pérolas bem-humoradas. "(Sou filho da Bahia com muita alegria/ Não interessa se o relógio já deu meio-dia)"; são os primeiros versos da primeira faixa Baiano não é palhaço, em que ele usa uma teoria própria para explicar que Juscelino Kubitschek e Leonel Brizola não eram mineiros nem gaúchos, e sim baianos! Por trás do humor, um discurso social engajado sobre o preconceito contra os imigrantes nordestinos (Até parece que estou noutro país/ Vê que piada infeliz inventaram agora/Ajude a manter a casa limpa/ Matando um baiano por hora).

Gordurinha veio para o Rio no início da década de 50, depois de fazer sucesso em rádios do Recife, onde conheceu Jackson do Pandeiro e Genival Lacerda. No Rio, era encarado com uma certa dose de preconceito e deboche, mas venceu se tornando uma celebridade na poderosa Rádio Nacional. Foi quando, paralelamente aos programas humorísticos, pôde exercitar a inata verve musical, gravando excelentes discos.

Suas elaboradas melodias misturavam com talento ritmos regionais, como o coco, o samba e o rojão, com a latinidade da rumba e do cha cha cha, que funcionavam à perfeição com os arranjos de orquestra.

A rumba "É um calo só" é um perfeito exemplar da face cronista do compositor (O feijão subiu, não posso comer feijão/ Condução subiu, não ando de condução/ Estou contando os postes e ninguém tem dó/ De tanto andar a pé, estou com o pé que é um calo só).

Mas o disco "A Bossa de Gordurinha", revela um outro lado seu: três belas e melancólicas letras de amor que caberiam perfeitamente em sambas-canções, mas cujas melodias têm a alegre expressão rítmica do samba tradicional.

Só a letra de "Anestesia pra moral" já vale o disco inteiro: (O meu destino é amargo/ Sem ela minha vida é tristonha/ Mas eu prefiro viver de saudade/ Do que morrer de vergonha/ Atualmente o problema é discernir o bem do mal/ Ou eles pensam/ Que existe anestesia pra moral?).

É que Gordurinha, por trás da couraça de palhaço, era um sujeito de vida sentimental complicada. Curava as feridas do coração com poesia e morfina. A droga (morfina) acabou levando-o à morte precoce, por enfarte, em janeiro de 1969. A poesia sobreviveu.

O CD "A Bossa do Gordurinha" - (1962 -Coleção RCA 100 anos - BMG - 2003)
1. Baiano não é palhaço
2. Não entendi bulufas
3. Amor & cia LTDA
4. De trás pra frente
5. Jamais
6. É um calo só
7. Carta de ABC
8. O problema é seu
9. Quem é você?
10. Anestesia pra moral
11. Sem ninguém
12. Aquarela do morro
Inclui texto de contracapa assinado por Rodrigo Faour

O cantor e compositor baiano Gordurinha (1922-69) começou a carreira nos anos 50, munido de um repertório rico em ritmos nordestinos e letras bem sacadas, carregadas na ironia e na crítica social. O autor de clássicos da MPB, como “Súplica Cearense” , “Vendedor de Caranguejo” e “Chiclete com Banana”, gravou em 1962 um LP com músicas que confirmavam seu estilo irreverente como “Baiano Não É Palhaço” e “Anestesia para a Moral”. Rodrigo Faour

CURIOSIDADE

A BMG comemorou os 100 anos do selo RCA lançando 20 títulos de seu catálogo pela primeira vez em CD. Todos os CDs foram remasterizados a partir dos tapes originais, tem projeto gráfico fiel às capas originais e receberam textos assinados por jornalistas como Tárik de Souza e Mauro Ferreira.

O samba se faz presente com títulos importantíssimos. “Cartola 70 Anos” (1979), tem no repertório o samba-enredo “Ciência e Arte”, o clássico “O Inverno do Meu Tempo”, o drama rural “Feriado na Roça” e “Mesma Estória”, parceria com Elton Medeiros.

Quatro Grandes do Samba” (1977), que traz Nelson Cavaquinho, Candeia, Guilherme de Brito e Elton Medeiros, tem a participação de Dona Ivone Lara em “Sou Mais Samba”, além de “A Flor e o Espinho”, “Gotas de Luar”, “Quando eu me chamar saudade”, “Notícia”, “Expressão do teu olhar”, entre outras.

Os Originais do Samba tem relançado seu “O Samba é a Corda... Os Originais a Caçamba” (1972) que traz os sucessos “Do lado direito da rua Direita”, “Esperanças Perdidas” e “Lá Vem Salgueiro”.

O compositor baiano Gordurinha aparece com seu estilo irreverente em “A Bossa de Gordurinha” (1962).

Ziriguidum no Sambão” (1971) da cantora Carmen Costa traz a “Marcha do Cordão do Bola Preta” e um raro samba sincopado de Luiz Gonzaga “A Mulher do Lino”.

Fruto e Raiz” (1986) foi o título escolhido da cantora Alcione, cujo sucesso se deu devido à canções românticas como “Garoto Maroto” e “O Que Eu Faço Amanhã”.

Essa primeira fase da coleção “RCA – 100 Anos de Música” lançou também: Alaíde Costa, Banda Black Rio, Cassiano, Cauby Peixoto, Cesar Camargo Mariano, Ednardo, Ivan Lins, João Bosco, João Donato, Luiz Gonzaga, Miucha & Tom Jobim, Orlando Silva, Quinteto Ternura e Wilson Simonal.

Os discos chegaram às lojas no início de setembro /2001– e o melhor! – em série econômica.

A segunda fase lançou no mesmo formato em outubro/2001 discos de Aracy de Almeida, Bezerra da Silva, Ciro Monteiro, Dircinha Batista, Jamelão, João Nogueira, Jorge Veiga, Martinho da Vila, Moreira da Silva, entre outros.

FONTE

Samba Choro

Samba Choro

Comentários

MeL disse…
Olá, tenho 22 anos e gosto bastante da obra do Gordurinha, embora conheça muito pouco ainda...Adorei o blog, vou visitá-lo mais vezes!!!
As músicas dele como Súplica Cearense e Poeira de Morte, são tocadas em forrós pé de serra...
muito legal seu blog, estamos seguindo! Se quiser passa lá: http://serralheriapradosverdesltda.blogspot.com/ . Estamos sorteando uma churrasqueira.
GORDURINHA NETO disse…
Obrigado pelos comentários. Gordurinha além de compor e cantar sambas, cocos, baiões, mambos... de grande sucesso, ele tbm participou do circo, teatro, rádio, cinema e televisão, deixando marcas admiráveis
de sua contribuição a memória sócio-cultural brasileira.

Viva Gordurinha!
JURA MPB SHOW disse…
Gordurinha um músico extraordinário da nossa rica e vasta música popular brasileira com divisões marcantes, muito molejo ....misturou bem o humor e a verdade em sua música..para sempre Gordurinha!! genial
JURA MPB SHOW disse…
Gordurinha um grande mestre de seu tempo em variados rítmos típicos , sintetizou o nordeste sofrido com muita alegria,uniu o humor e a verdade em sua música. Parabéns Gordurinha sua música ainda está bem viva em nossos corações!!!

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