Wilson Café e Gordurinha
GAZETA MERCANTIL
26 de agosto de 1997
Wilson Café homenageia mestres em CD
Num ótimo disco, instrumentista aposta em clássicos de Jackson do Pandeiro, Luiz Gonzaga e o esquecido Gordurinha. Não chega a ser revelador que a música de qualidade precise estar relacionada a erudição, a sofisticação da melodia ou a seus versos bem elaborados. Essas características, no entanto, não impedem a canção popular, que já desfruta de reconhecimento e respeito de historiadores e críticos, de conquistar e desfrutar o status de boa música. A canção nordestina tem exemplo disso em clássicos de Jackson do Pandeiro, Luiz Gonzaga, Manezinho Araújo e o esquecido Waldeck Arthur de Macedo, o Gordurinha, compositor do pelourinho, em Salvador.
Ver algumas de suas mais importantes composições reunidas num só disco talves seja uma boa idéia para medir a dimensão de sua obra. O disco Coração de Tambor, do Percussionista Wilson Café faz isso com ousadia: além de enfrentar o desafio do registro ao vivo, ele deu novos arranjos e incorporou a música clássica de Heitor Villa Lobos, num trabalho uniforme e bem acabado.
O CD será apresentado hoje, a partir das 21h, em coquetel no Museu de Arte da Bahia. Mesmo com um tipo de música das mais populares – daquelas que, não faz muito tempo, costumava-se ouvir em rodas de amigos e festas populares. Café fez um disco fadado a nunca aparecer na programação das emissoras de rádio baianas. O percussionista e compositor optou por fazer um trabalho que foge da música fácil e repetitiva que se faz em Salvador.
Já na primeira audição, Coração de Tambor consegue manter a naturalidade do show ao vivo, num disco surpreendente, com repertório de bom gosto, arranjos inteligentes, capazes de preservar a originalidade das canções, apenas acrescentando pequenos retoques percussivos na maioria das faixas. O desafio aparece nas excelentes execuções do forró Olha pro Céu, de Luiz Gonzaga e José Fernandes; na toada asa Branca, tão reinventada desde o seu lançamento, há exatos 50 anos. Nem mesmo sua decisão em aparecer como cantor prejudica o conjunto do disco. Ao invés de buscar a diversidade de instrumentos para compor seus arranjos e até mesmo os delírios de sons possíveis na percussão, Café limitou-se a poucos instrumentos. Além disso, o instrumentista conseguiu combinar com eficiência a percussão com os instrumentos tradicionais da música nordestina – sanfona e flauta.
Para compor a seleção das doze faixas – quatro delas de sua autoria – café recorreu às lembranças da infância. Seus homenageados, justificou, fazem parte de um time de artistas responsáveis pela construção da identidade musical nordestina – o que chamou de Coração do Brasil. Assim Gonzaga é o coração da melodia nordestina; Jackson do Pandeiro, do ritmo; Manezinho de Araújo, da embolada; e Gordurinha, da sensibilidade e da crítica social.
O show é aberto com a participação especial da atriz Nilda Spencer, que recita Sagrado é o Meu Santo, de Paulo Atto. A seguir, duas emboladas da dupla Jaime Sodré e Wilson Café – Sagrado Profano de Lá Vem o Coco. Depois, café apresenta Dezessete e Setecentos, dele e de J. Velloso, um dos produtivos compositores da nova geração. As homenagens começam com o conhecido contagiante coco Sebastiana, composição maliciosa que consagrou Rosil Cavalcanti, e popularizou Jackson do Pandeiro, em 1953, O maranhense João do Vale é lembrado com O Canto da Ema – pareceria com Ayres Viana e Alvetino Cavalcanti), consagrada por Gilberto Gil, no LP Expresso 2222 de 1974. Um dos melhores momentos do disco é o resgate do talentoso Gordurinha. No disco, o compositor aparece nas impagáveis Baiano Burro Nasce Morto e Vendedor de Caranguejo.
Café também agrada com a versão de Cuma É O Nome Dele, a mais famosa embolada de Manoelzinho Araújo. Lançada em 1963. Manoelzinho, morto há dois anos, foi o responsável por levar a embolada – forma poético-musical bem humorada, em compasso binário e andamento rápido, utilizada por solistas ou em diálogos e desafios – para São Paulo e Rio de Janeiro.
O CD foi gravado nas duas apresentações de Café no Teatro da ACBEU, nos dias 16 e 17 de outubro do ano passado. O show teve a direção musical do maestro Luciano Chaves.
Um dos trunfos de café está na qualidade e no entrosamento dos músicos – Edu Fagundes (violão) Paulo Reis (percussão), Cícero (sanfona), André Becker (sax), Dunga Dantas(trumpete) e Luciano Chaves (flauta). A seqüência com que arrumou consegue dar uniformidade ao disco. Nem mesmo o break para execução da belíssima Trenzinho Caipira, de Heitor Villa-Lobos distoa na seqüência. Acompanhado de celos de Marcos Roriz, Lima e Cândida Lobão, Café faz do clássico de Villa-Lobos um momento especial do disco, dando-lhe uma roupagem nordestina eficiente.
Este é o segundo CD de Café e o primeiro em que aparece como cantador – como ele mesmo de define. Para homenagear os dez músicos que considera os cavaleiros da música nordestina, o percussionista passou um ano pesquisando uma série de ritmos do Norte e Nordeste, como Maxixe, a embolada e o baião – combinado este com o rap americano. Para isso, contou com a colaboração do pesquisador baiano Perfilino Neto, dono de um dos importantes acervos musicais do País. Segundo Café, a embolada, ritmo nordestino no qual a música é um diálogo, é o verdadeiro rap, já que o canto dos arppers também é um discurso.
Vencedor do Troféu Caymmi 1994 café tem procurado construir sua carreira em cima de apresentações, onde pode mostrar seu potencial artístico. Sua proposta é explorar sonoridades de instrumentos percussivos, o que fez com maestria no primeiro CD, Batam Palmas, e resgatar as raízes rítmicas brasileiras, como faz em Coração de Tambor.
FONTE
http://www.wilsoncafe.com.br/materias/gazetamercantil.htm
26 de agosto de 1997
Wilson Café homenageia mestres em CD
Num ótimo disco, instrumentista aposta em clássicos de Jackson do Pandeiro, Luiz Gonzaga e o esquecido Gordurinha. Não chega a ser revelador que a música de qualidade precise estar relacionada a erudição, a sofisticação da melodia ou a seus versos bem elaborados. Essas características, no entanto, não impedem a canção popular, que já desfruta de reconhecimento e respeito de historiadores e críticos, de conquistar e desfrutar o status de boa música. A canção nordestina tem exemplo disso em clássicos de Jackson do Pandeiro, Luiz Gonzaga, Manezinho Araújo e o esquecido Waldeck Arthur de Macedo, o Gordurinha, compositor do pelourinho, em Salvador.
Ver algumas de suas mais importantes composições reunidas num só disco talves seja uma boa idéia para medir a dimensão de sua obra. O disco Coração de Tambor, do Percussionista Wilson Café faz isso com ousadia: além de enfrentar o desafio do registro ao vivo, ele deu novos arranjos e incorporou a música clássica de Heitor Villa Lobos, num trabalho uniforme e bem acabado.
O CD será apresentado hoje, a partir das 21h, em coquetel no Museu de Arte da Bahia. Mesmo com um tipo de música das mais populares – daquelas que, não faz muito tempo, costumava-se ouvir em rodas de amigos e festas populares. Café fez um disco fadado a nunca aparecer na programação das emissoras de rádio baianas. O percussionista e compositor optou por fazer um trabalho que foge da música fácil e repetitiva que se faz em Salvador.
Já na primeira audição, Coração de Tambor consegue manter a naturalidade do show ao vivo, num disco surpreendente, com repertório de bom gosto, arranjos inteligentes, capazes de preservar a originalidade das canções, apenas acrescentando pequenos retoques percussivos na maioria das faixas. O desafio aparece nas excelentes execuções do forró Olha pro Céu, de Luiz Gonzaga e José Fernandes; na toada asa Branca, tão reinventada desde o seu lançamento, há exatos 50 anos. Nem mesmo sua decisão em aparecer como cantor prejudica o conjunto do disco. Ao invés de buscar a diversidade de instrumentos para compor seus arranjos e até mesmo os delírios de sons possíveis na percussão, Café limitou-se a poucos instrumentos. Além disso, o instrumentista conseguiu combinar com eficiência a percussão com os instrumentos tradicionais da música nordestina – sanfona e flauta.
Para compor a seleção das doze faixas – quatro delas de sua autoria – café recorreu às lembranças da infância. Seus homenageados, justificou, fazem parte de um time de artistas responsáveis pela construção da identidade musical nordestina – o que chamou de Coração do Brasil. Assim Gonzaga é o coração da melodia nordestina; Jackson do Pandeiro, do ritmo; Manezinho de Araújo, da embolada; e Gordurinha, da sensibilidade e da crítica social.
O show é aberto com a participação especial da atriz Nilda Spencer, que recita Sagrado é o Meu Santo, de Paulo Atto. A seguir, duas emboladas da dupla Jaime Sodré e Wilson Café – Sagrado Profano de Lá Vem o Coco. Depois, café apresenta Dezessete e Setecentos, dele e de J. Velloso, um dos produtivos compositores da nova geração. As homenagens começam com o conhecido contagiante coco Sebastiana, composição maliciosa que consagrou Rosil Cavalcanti, e popularizou Jackson do Pandeiro, em 1953, O maranhense João do Vale é lembrado com O Canto da Ema – pareceria com Ayres Viana e Alvetino Cavalcanti), consagrada por Gilberto Gil, no LP Expresso 2222 de 1974. Um dos melhores momentos do disco é o resgate do talentoso Gordurinha. No disco, o compositor aparece nas impagáveis Baiano Burro Nasce Morto e Vendedor de Caranguejo.
Café também agrada com a versão de Cuma É O Nome Dele, a mais famosa embolada de Manoelzinho Araújo. Lançada em 1963. Manoelzinho, morto há dois anos, foi o responsável por levar a embolada – forma poético-musical bem humorada, em compasso binário e andamento rápido, utilizada por solistas ou em diálogos e desafios – para São Paulo e Rio de Janeiro.
O CD foi gravado nas duas apresentações de Café no Teatro da ACBEU, nos dias 16 e 17 de outubro do ano passado. O show teve a direção musical do maestro Luciano Chaves.
Um dos trunfos de café está na qualidade e no entrosamento dos músicos – Edu Fagundes (violão) Paulo Reis (percussão), Cícero (sanfona), André Becker (sax), Dunga Dantas(trumpete) e Luciano Chaves (flauta). A seqüência com que arrumou consegue dar uniformidade ao disco. Nem mesmo o break para execução da belíssima Trenzinho Caipira, de Heitor Villa-Lobos distoa na seqüência. Acompanhado de celos de Marcos Roriz, Lima e Cândida Lobão, Café faz do clássico de Villa-Lobos um momento especial do disco, dando-lhe uma roupagem nordestina eficiente.
Este é o segundo CD de Café e o primeiro em que aparece como cantador – como ele mesmo de define. Para homenagear os dez músicos que considera os cavaleiros da música nordestina, o percussionista passou um ano pesquisando uma série de ritmos do Norte e Nordeste, como Maxixe, a embolada e o baião – combinado este com o rap americano. Para isso, contou com a colaboração do pesquisador baiano Perfilino Neto, dono de um dos importantes acervos musicais do País. Segundo Café, a embolada, ritmo nordestino no qual a música é um diálogo, é o verdadeiro rap, já que o canto dos arppers também é um discurso.
Vencedor do Troféu Caymmi 1994 café tem procurado construir sua carreira em cima de apresentações, onde pode mostrar seu potencial artístico. Sua proposta é explorar sonoridades de instrumentos percussivos, o que fez com maestria no primeiro CD, Batam Palmas, e resgatar as raízes rítmicas brasileiras, como faz em Coração de Tambor.
FONTE
http://www.wilsoncafe.com.br/materias/gazetamercantil.htm
Comentários